A nova direita de Kim Kataguiri: Como o MBL rompeu com Bolsonaro e as propostas radicais do partido "Missão para 2026"
O deputado federal Kim Kataguiri, que surgiu no cenário político como uma das faces mais radicais do Movimento Brasil Livre (MBL), apresenta um notável processo de amadurecimento e reposicionamento ideológico. Em uma entrevista à BBC News Brasil, o parlamentar faz um balanço de sua trajetória, detalha sua ruptura com o bolsonarismo e revela seus ambiciosos planos, que incluem o lançamento do partido "Missão" e a disputa pela Presidência em 2026 com um candidato próprio.
O distanciamento e a crítica direta a Jair Bolsonaro
Kataguiri estabelece uma linha de oposição clara e intransigente a Bolsonaro, contrastando com o "voto útil" que lhe foi dado no segundo turno de 2018. Essa postura reflete a fragmentação no campo da direita brasileira e a rejeição aos métodos do ex-presidente.
- Traição às promessas: O deputado acusa Bolsonaro de ter traído suas promessas de campanha, especialmente no combate à corrupção.
- Blindagem e negociação política: Cita a blindagem ao filho, Flávio Bolsonaro, como o fator que levou o ex-presidente a "vender o país" em troca de proteção política.
- Enfraquecimento de órgãos de controle: Menciona o enfraquecimento de operações como a Lava Jato e as nomeações para a Procuradoria-Geral da República (PGR) (Augusto Aras) e para o Supremo Tribunal Federal (STF) (Kassio Nunes Marques) que, em sua visão, tiveram motivações políticas.
- Irresponsabilidade fiscal: Critica a "PEC Kamikaze", que teria, segundo ele, criado um rombo fiscal de
R$ 150 bilhões. - Tentativa de interferência: Relata uma tentativa do ex-presidente de interferir em seu trabalho na Comissão de Educação da Câmara.
Posição sobre a prisão e o processo de Bolsonaro
O parlamentar adota uma postura de condenação ao ato, mas de crítica à condução do processo pela Justiça, um ponto de debate frequente sobre a atuação do STF.
- Intenção de golpe: É categórico ao afirmar: "Acho que ele tentou de fato dar um golpe de Estado", citando a minuta de golpe encontrada no Palácio do Planalto como prova.
- Críticas ao STF: Embora concorde com a pena, Kataguiri argumenta que o Supremo Tribunal Federal (STF) "atropelou o processo", citando vícios como a definição do foro, a condução do julgamento por uma turma e não pelo plenário, e a prática de "data dumping" que prejudicou a defesa.
- Cumprimento da pena: Defende que Bolsonaro "deve cumprir pena na cadeia, sim", ressalvando que ele deve ter acesso a tratamento hospitalar quando necessário, mas negando que sua condição de saúde exija prisão domiciliar.
A reinvenção ideológica e as propostas do missão
Um dos pontos mais notáveis é a declaração de mudança em sua visão de mundo, afastando-se de um liberalismo dogmático em favor de uma visão mais pragmática e nacional-liberal.
- Fim do dogma liberal: A nova visão mostra um pragmatismo crescente e uma tentativa de ampliar o apelo eleitoral para além da base original.
- Privatizações pragmatismo: Abandona o dogma da privatização total: "Aquilo que é público, que funciona bem, não precisa ser privatizado". Cita instituições como Embrapa, ITA e hospitais universitários eficientes como exemplos de estatal que deve ser mantida.
- Gestão do SUS: Abandona a defesa da privatização total, advogando por uma mudança no modelo de gestão: conceder à iniciativa privada apenas hospitais estatais ineficientes, mantendo públicos os que funcionam bem.
Principais bandeiras do partido "Missão":
1. Segurança pública dura: Defende o "Direito Penal do Inimigo" para facções criminosas. Propõe uma nova Constituição que permita a pena de morte e a prisão perpétua para líderes do crime organizado.
2. Reforma orçamentária e fiscal: Propõe o fim das vinculações constitucionais de gastos (saúde e educação) para flexibilizar o orçamento. Defende o corte de "supersalários" no Judiciário e Legislativo e a revisão de renúncias fiscais para a "elite privada".
Estratégia política: MBL, Missão e a corrida de 2026
A criação do Partido Missão é uma tentativa de institucionalizar o MBL, buscando autonomia e um novo polo na direita.
- O lançamento do partido: Kataguiri renuncia à segurança de um partido grande (União Brasil) para lançar o Missão, visando disputar o poder de forma autônoma.
- Candidatura presidencial em 2026: O plano é lançar Renan Santos, cofundador do MBL, como candidato à Presidência, já que Kataguiri não tem a idade mínima. Kataguiri pode concorrer ao governo de São Paulo ou a uma vaga no Congresso.
- Previsão sobre Lula: Mantém a previsão de que é
"mais provável que ele não seja candidato do que seja"em 2026, argumentando que Lula estaria mais focado em seu legado histórico.
Um projeto de estadista em construção
A trajetória de Kim Kataguiri aponta para um político em profunda transição: de jovem líder de protestos a um parlamentar que busca ser um estadista pragmático com um projeto de governo detalhado, embora com propostas de segurança pública radicais. Sua ruptura definitiva com o bolsonarismo e sua evolução ideológica indicam um esforço para amadurecer politicamente e expandir sua base eleitoral.
