Janja e as polêmicas no poder: Entre representatividade, influência e controvérsia

A figura de Rosângela Lula da Silva, conhecida como Janja, tem provocado debates intensos no cenário político brasileiro. Primeira-dama do Brasil desde a posse de Luiz Inácio Lula da Silva em 2023, Janja se diferencia por adotar um perfil mais vocal e ativo, abordando publicamente temas sensíveis da política nacional e internacional. Isso tem gerado admiração entre seus apoiadores e fortes críticas de seus opositores, em um contexto político já marcado pela polarização.
O que torna Janja uma figura única entre as primeiras-damas brasileiras
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Ao contrário de muitas das primeiras-damas anteriores, Janja assumiu um papel de protagonismo. Ela não se limita a funções cerimoniais e participa de eventos nacionais e internacionais, muitas vezes opinando de forma contundente. Exemplo disso foi quando, em novembro de 2024, durante o G20 no Rio de Janeiro, ela criticou duramente o bilionário Elon Musk, recém-nomeado para o governo de Donald Trump, com um xingamento em inglês que arrancou aplausos de uma plateia jovem, mas gerou tensões diplomáticas.
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Poucos meses depois, em maio de 2025, Janja novamente chamou atenção ao questionar diretamente o presidente chinês Xi Jinping sobre a atuação global do TikTok — atitude considerada imprópria por parte dos presentes, dado o protocolo diplomático e a delicadeza do tema para o governo chinês.
Os riscos e vantagens de uma primeira-dama politicamente engajada
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Janja se tornou alvo de análises políticas e jurídicas, especialmente por não ocupar um cargo oficial dentro da administração pública, o que gera dúvidas sobre os limites de sua atuação. A BBC News Brasil ouviu especialistas que destacaram que essa ambiguidade contribui para o aumento das críticas, embora parte delas também possa estar enraizada no machismo e na misoginia ainda presentes na sociedade brasileira.
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Segundo a Advocacia-Geral da União (AGU), o papel do cônjuge presidencial é simbólico, cerimonial e voluntário, mas a mesma normativa reconhece que ele pode representar o presidente em certas ocasiões de maneira informal. Essa indefinição, apontada por sociólogas como Jéssica Rivetti Melo e Luciana Santana, aumenta o escrutínio público e torna a atuação da primeira-dama um campo nebuloso.
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Além disso, Janja também foi protagonista de outras polêmicas, como quando declarou que móveis haviam desaparecido do Palácio da Alvorada após a gestão Bolsonaro. A afirmação foi desmentida posteriormente, levando o casal Lula-Janja a ser condenado pela Justiça a pagar R$ 15 mil por danos morais à família Bolsonaro.
Influência simbólica ou política de fato?
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Mesmo sem cargo formal, Janja participa ativamente da agenda política e social do governo, seja em viagens internacionais, seja em manifestações públicas como a que fez em apoio à ministra Anielle Franco, durante uma crise envolvendo denúncias contra o ex-ministro Silvio Almeida. Essa atuação pública intensifica questionamentos sobre até que ponto sua influência ultrapassa o papel simbólico tradicionalmente atribuído a primeiras-damas.
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Levantamento do portal Poder360 mostrou que as atividades de Janja têm um custo anual de aproximadamente
R$ 2 milhões
, incluindo viagens, assessores e segurança, o que também é motivo de críticas, especialmente por parte de figuras da oposição como o ex-deputado Deltan Dallagnol, que chegou a pedir formalmente acesso à agenda da primeira-dama.
Comparações com outras primeiras-damas e o impacto da polarização
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Especialistas lembram que o Brasil já teve primeiras-damas ativas, como Ruth Cardoso, que liderou projetos sociais durante o governo FHC, e Michelle Bolsonaro, que atuou junto à pauta da deficiência. A diferença é que Janja transita por diversas frentes sem uma agenda definida, o que causa desconforto em setores que esperam uma delimitação clara desse papel.
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Luciana Santana, da Universidade Federal de Alagoas, argumenta que a crítica à atuação de Janja também está fortemente ligada ao momento atual do país, em que a divisão ideológica é intensa. Como exemplo dessa polarização, o próprio Dallagnol, conhecido por seu papel na Operação Lava Jato que prendeu Lula, teve sua atuação contra Janja marcada por pedidos de investigação, antes de ser cassado por crimes eleitorais.
Entre o novo e o controverso
- Janja representa um modelo de primeira-dama diferente, mais participativo e combativo, que rompe com o padrão tradicional. Essa nova postura gera um debate necessário sobre o papel simbólico versus a influência política de quem ocupa esse espaço ao lado do presidente. Se, por um lado, sua voz ativa pode inspirar engajamento e visibilidade para pautas sociais, por outro, sua falta de mandato e a ambiguidade institucional tornam suas ações controversas.
O Brasil, ainda em transição entre velhas estruturas e novas dinâmicas de poder, precisa decidir se a figura da primeira-dama continuará sendo apenas simbólica ou se deve ser formalizada de modo a estabelecer limites e responsabilidades claras. Até lá, Janja seguirá sendo uma das personagens mais comentadas da política nacional — para o bem ou para o mal.