De Lama reencarnado a rebelde: A trajetória de Osel Torres do mosteiro às baladas de Ibiza – História real de fé e liberdade

A história de Osel Hita Torres é uma jornada cativante de identidade, liberdade e autodescoberta. Reconhecido aos dois anos como a reencarnação do mestre budista Lama Yeshe, Osel viveu uma infância atípica, marcada por isolamento, estudos rigorosos e veneração. Sua decisão de deixar o monastério aos 18 anos para explorar o mundo "comum" revela desafios universais: a busca por pertencimento e a conciliação entre as expectativas alheias e a sua própria verdade.
O reconhecimento como Tulku: Uma infância sob o peso da espiritualidade
A vida de Osel Hita Torres começou de forma singular, no centro de uma das tradições mais complexas do budismo tibetano.
- A origem do Lama reencarnado: Nascido na Espanha em 1985, apenas um ano após a morte de Lama Yeshe, um mestre budista tibetano que popularizou sua filosofia no Ocidente, Osel era filho de Maria e Paco, um casal de hippies espanhóis que haviam conhecido Yeshe em Ibiza nos anos 1970.
- O processo de identificação: Aos 14 meses de idade, Osel foi levado à Índia, onde passou por testes tradicionais, como o reconhecimento de objetos pessoais de Lama Yeshe. O Dalai Lama, então, confirmou sua identidade como tulku (mestre reencarnado), e Osel foi entronizado em uma cerimônia grandiosa quando tinha apenas dois anos.
- A vida no monastério: Criado exclusivamente por monges, sem contato com sua família biológica ou outras crianças, Osel enfrentou uma rotina de solidão e a imensa pressão de cumprir um legado espiritual. Seus dias incluíam até sete horas de estudos budistas.
Pontos importantes:
- Essa fase da vida de Osel ilustra a complexidade do sistema tulku, fundamental no budismo tibetano, mas que levanta questionamentos ocidentais sobre infância e autonomia.
- Mostra o profundo conflito entre tradição e individualidade, especialmente em contextos interculturais onde os valores podem divergir drasticamente.
A rebelião adolescente: Rock, Britney Spears e a descoberta do mundo "proibido"
À medida que Osel crescia, o mundo exterior começou a exercer uma atração irresistível, desencadeando uma fase de rebeldia e autodescoberta.
- O contrabando cultural: Dentro dos muros do monastério, Osel encontrou refúgios secretos na cultura ocidental. Ele acessava clandestinamente música de artistas como Linkin Park e Tracy Chapman, e assistia a vídeos de Britney Spears, que se tornaram suas válvulas de escape. As letras de rock, em particular, ressoavam com seu sentimento de incompreensão e busca por algo mais.
- A experiência em Ibiza: Aos 16 anos, Osel convenceu seus mentores a permitir-lhe estudar por dois meses em uma escola espanhola, onde usou o pseudônimo "Nicolas". Lá, ele enfrentou bullying, vivenciou seu primeiro beijo e descobriu a liberdade de andar de moto — experiências que contrastavam drasticamente com sua vida monástica.
Pontos importantes:
- Destaca o papel da cultura pop como uma poderosa ferramenta de resistência e autoconhecimento, permitindo que Osel explorasse aspectos de sua identidade que eram reprimidos.
- Expõe o profundo choque cultural entre a disciplina monástica e a liberdade individual tão valorizada no Ocidente.
A ruptura definitiva: Abandonando o título de Lama
Aos 18 anos, Osel tomou uma decisão que mudaria sua vida para sempre, escolhendo seu próprio caminho em vez do destino que lhe havia sido imposto.
- A fuga aos 18 anos: No dia de seu aniversário, Osel anunciou sua decisão de não retornar ao monastério. Recebeu cartas de profunda decepção de muitos de seus seguidores, mas permaneceu firme em sua escolha, declarando: "A felicidade das pessoas não era minha responsabilidade".
- A vida após o monastério: Após a ruptura, Osel mergulhou em experiências extremas: das baladas vibrantes de Ibiza a viver nas ruas na Itália. Ele estudou cinema e se tornou músico. Aos 32 anos, tornou-se pai, priorizando dar ao filho a estabilidade emocional que ele próprio havia sentido falta em sua infância.
Pontos importantes:
- Levanta questões éticas profundas sobre a imposição de identidades espirituais a crianças, e o impacto a longo prazo dessas decisões.
- Reflete sobre a notável resiliência humana e a capacidade de reconstrução da identidade após experiências tão formativas.
O retorno às raízes: Ambientalismo e um novo legado
Anos depois de sua ruptura, Osel não rejeitou completamente seu passado espiritual, mas redefiniu sua conexão com ele, encontrando um novo propósito.
- Reconexão com o Budismo: Com o tempo, Osel voltou a se conectar com a comunidade budista, mas agora em seus próprios termos. Ele fundou uma ONG focada no plantio de árvores e começou a dar palestras, adaptando os ensinamentos budistas para o contexto ocidental.
- Reflexão sobre a reencarnação: Apesar do ceticismo inicial, Osel passou a reconhecer traços de Lama Yeshe em si mesmo, mas sempre com a ressalva: "Minha vida é minha vida", enfatizando sua individualidade.
Pontos importantes:
- Mostra que a evolução espiritual é um processo intrinsecamente pessoal, que não pode ser imposto, mas deve ser descoberto.
- Inspira discussões importantes sobre o equilíbrio entre tradição e modernidade nas práticas religiosas e espirituais.
Uma lição sobre liberdade e autenticidade
A história de Osel Hita Torres é um convite poderoso à reflexão sobre como as expectativas alheias podem moldar — e, por vezes, aprisionar — nossas vidas. Sua jornada, da reclusão monástica às baladas de Ibiza e, finalmente, ao ativismo ambiental, ilustra a busca universal por significado e autonomia. Osel não rejeitou seu passado espiritual, mas redefiniu seu papel, provando que a identidade e a fé podem ser fluidas e se adaptar às necessidades individuais. Sua trajetória ressoa não apenas como um conto budista intrigante, mas como um manifesto sobre o direito de ser humano, em todas as suas complexidades e contradições.