Mães PJ no Brasil: A crise silenciosa da maternidade sem direitos trabalhistas - O que acontece quando trabalhadoras PJ engravidam?

A crescente adesão ao trabalho como pessoa jurídica (PJ) no Brasil, especialmente entre microempreendedores individuais (MEIs), trouxe autonomia para muitos, mas expôs mulheres grávidas a vulnerabilidades. Sem direitos como licença-maternidade ou estabilidade, mães PJ relatam demissões sumárias, discriminação e dificuldades financeiras. Este resumo detalha os desafios dessas trabalhadoras, as lacunas legais e o debate no Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a "pejotização".
A realidade das mães PJ: Demissões e discriminação
- Caso de Grace Urbinati: Fisioterapeuta demitida ao anunciar gravidez, mesmo com promessa inicial de apoio. Como PJ, perdeu renda e enfrentou rejeição em processos seletivos ao revelar a gestação.
- Larissa (nome preservado): Ouviu do chefe:
"Você vai dar conta com duas filhas?"
após ser dispensada grávida do segundo filho. Trabalhava sob condições CLT (horário fixo, hierarquia), mas sem direitos. - Valesca Grotmann: Demitida com o bebê no colo após retornar ao trabalho um mês pós-parto. Relatou exclusão gradual de tarefas e padrão de demissão de outras mães na empresa.
Dados relevantes:
- Em 2025, 78% dos novos CNPJs abertos eram MEIs (Sebrae).
- Apenas 3% das mulheres com CLT usufruíram de licença-maternidade em 2023 (IBGE).
- 20% das mães são demitidas até dois anos após a licença (Dieese).
Direitos trabalhistas: CLT vs. PJ
CLT:
- Estabilidade gestacional, licença de 120 dias (podendo chegar a 180), salário integral, FGTS e multa rescisória.
PJ:
- Licença-maternidade só é garantida se a MEI contribuir com INSS por 10 meses (120 dias com um salário mínimo).
- Sem estabilidade, 13º, férias ou jornada controlada.
- Contratos podem ser rescindidos a qualquer momento, sem justa causa.
Problema central: Muitos contratos PJ simulam vínculos CLT (com horários e subordinação), mas burlam obrigações trabalhistas.
O debate jurídico: Pejotização no STF
Contexto: Em 2022, o STF validou a pejotização em um caso envolvendo médicos, mas em 2025 suspendeu todos os processos sobre o tema no país para evitar decisões conflitantes.
Argumentos:
- Contra a pejotização: Especialistas como a advogada Veruska Schmidt alertam que o modelo mascara vínculos empregatícios e prejudica grupos vulneráveis, como mães.
- A favor: Defensores, como o ex-ministro Almir Pazzianotto, veem a PJ como resposta à economia flexível e à preferência por autonomia.
- Audiência pública: Marcada para setembro/2025, o STF discutirá critérios para evitar fraudes trabalhistas.
Impacto social e de gênero
- Invisibilidade das mães: Sem CLT, empresas ignoram políticas de diversidade. Mulheres são pressionadas a escolher entre maternidade e carreira.
- Efeitos psicológicos: Relatos como o de Grace
("Me senti inválida")
mostram o custo emocional da insegurança. - Precarização ampliada: Trabalhadoras sem direitos evitam denunciar assédio ou más condições por medo de demissão.
"A maternidade tem um preço que a paternidade nunca pagará: é o corpo que se transforma, a carreira que pausa, os sonhos que se recalibram. Enquanto homens seguem sendo avaliados por sua produtividade, mulheres são julgadas por sua disponibilidade. Não se trata de comparar papéis, mas de reconhecer que a gravidez é um divisor de águas físico, emocional e profissional exclusivamente feminino e que uma sociedade justa não pode fingir que essa assimetria não existe."
Um desafio estrutural
A pejotização reflete mudanças profundas no mercado de trabalho, mas sua regulamentação falha em proteger mulheres grávidas. Enquanto o STF debate a legalidade desses contratos, mães PJ enfrentam realidades desiguais, muitas vezes obrigadas a retomar atividades dias após o parto. A solução exigirá não apenas ajustes legais, mas uma mudança cultural que reconheça a maternidade como direito, não como ônus.