Setembro Amarelo: É hora de reavaliar a saúde mental de quem cuida, para cuidar bem

A saúde mental de crianças e adolescentes é uma questão urgente de saúde pública, destacada anualmente pela campanha do Setembro Amarelo. Dados recentes pintam um quadro preocupante. O relatório KidsRights Index 2025, citado pela matéria da CNN, revela que mais de 14% dos jovens entre 10 e 19 anos em todo o mundo enfrentam problemas de saúde mental. Em um dado ainda mais grave, a Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta o suicídio como a terceira principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos. Este contexto sublinha a importância crítica de a família, especialmente os pais, atuar como primeira linha de apoio, acolhimento e proteção.
Fatores de risco: Entendendo as pressões modernas
A neuropsicóloga Geiza Antunes, da Associação Brasileira de Familiares, Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (ABRATA), elenca uma combinação complexa de fatores que contribuem para esse cenário. Entre os principais estão:
- As cobranças excessivas do ambiente escolar.
- A constante comparação com colegas e a pressão social.
- O uso excessivo e, muitas vezes, não supervisionado das redes sociais.
- As desigualdades socioeconômicas que geram estresse e insegurança.
- Os impactos prolongados da pandemia de Covid-19, que isolou socialmente muitos jovens.
A esse conjunto, a OMS acrescenta relações familiares conturbadas, experiências de violência, bullying e a própria e natural busca por identidade, que pode ser uma fonte de angústia.
Estratégias práticas: Como os pais podem ajudar de forma efetiva
Diante desses desafios, a especialista oferece orientações práticas baseadas em evidências para que os pais construam uma rede de apoio sólida e saudável.
1. A importância da escuta ativa e da comunicação não-violenta:
- Ouvir sem julgamentos é a base para que os jovens se sintam seguros para compartilhar suas angústias.
- A técnica da Comunicação Não-Violenta (CNV) é extremamente valiosa: ela ensina a observar fatos sem criticar, expressar sentimentos e necessidades de forma clara, e transformar exigências em pedidos negociáveis.
- Essa abordagem promove um diálogo leve e constrói uma relação de confiança, mostrando ao adolescente que sua voz é ouvida e validada.
2. A qualidade do tempo e a presença significativa:
- Pesquisas indicam que a presença ativa dos pais, mesmo com rotinas corridas, fortalece vínculos e cria um crucial senso de pertencimento.
- Não se trata de quantidade, mas de qualidade: uma refeição feita juntos sem interferências digitais, uma caminhada, ou uma conversa dedicada valem mais do que horas de coexistência distraída.
- Demonstrar interesse genuíno pelos hobbies, gostos e rotina dos filhos faz com que eles se sintam valorizados e seguros, atuando como um poderoso fator de proteção.
3. O autocuidado parental como fundamento inegociável:
Este é um ponto de extrema relevância e, por vezes, negligenciado: a saúde mental dos pais impacta diretamente a dos filhos.
- Um estudo publicado na renomada revista JAMA Pediatrics, citado na matéria, associou o sofrimento mental dos pais a um desenvolvimento abaixo da média nas crianças, afetando cognição, habilidades socioemocionais e linguagem.
- Pais com depressão ou ansiedade não tratadas tendem a criar um ambiente instável, com dificuldades de comunicação e maior propensão a conflitos, o que aumenta o risco de transtornos emocionais nos filhos.
- Cuidar da própria saúde mental não é egoísmo; é uma responsabilidade para com a família.
Construindo um ambiente emocionalmente seguro:
Para fortalecer a saúde mental de toda a família, a neuropsicóloga recomenda a manutenção de uma rotina equilibrada que inclua:
- Hábitos saudáveis de sono, alimentação e prática de atividade física.
- Momentos intencionais de lazer em família, que criam boas memórias e reduzem o estresse coletivo.
- Incentivo à conversa aberta sobre sentimentos.
- Busca por apoio psicológico sem estigma quando necessário.
- Fortalecimento da rede de apoio com amigos e familiares.
- Práticas de relaxamento como técnicas de respiração, ioga ou leitura, que contribuem para um ambiente mais seguro e sereno.
Uma rede de apoio alicerçada no afeto e na consciência
A jornada pela saúde mental dos adolescentes é complexa e multifacetada, mas os pais são agentes fundamentais de transformação e proteção. A combinação de escuta ativa, comunicação não-violenta, tempo de qualidade e, crucialmente, o cuidado com o próprio bem-estar emocional dos adultos, forma uma base sólida para que os jovens naveguem pelos desafios desta fase. O Setembro Amarelo serve como um lembrete anual de que combater o estigma, promover diálogo e buscar ajuda são atos de coragem e amor que podem, literalmente, salvar vidas. A saúde mental é um patrimônio coletivo que deve ser cultivado diariamente dentro de casa.