Licença-paternidade ampliada: O que 20 dias significam para o vínculo com o filho e a carreira da mãe?
A aprovação de um projeto de lei pela Câmara dos Deputados em 4 de novembro de 2025 marca um momento histórico para a corresponsabilidade parental no Brasil. A proposta, que segue para o Senado, regulamenta um direito fundamental da Constituição de 1988 e atende a uma exigência do Supremo Tribunal Federal (STF), elevando a licença-paternidade de 5 para 20 dias.
O que muda na prática? Detalhes da nova lei
A ampliação da licença será implementada de forma gradual, com o objetivo de adaptar-se às metas fiscais do governo federal, e traz consigo diversas inovações:
1. Aumento progressivo do período:
- A licença remunerada de 5 dias passará, em etapas, para 10, depois para 15 e, finalmente, atingirá o patamar de 20 dias.
2. Abrangência do benefício: A nova regra cobre um vasto público de trabalhadores:
- Empregados com carteira assinada (CLT).
- Trabalhadores avulsos.
- Microempreendedores individuais (MEI).
3. Diversidade familiar:
- O direito se estende a pais biológicos, adotivos e àqueles que obtiverem guarda judicial de crianças ou adolescentes.
- No caso de casais homoafetivos, a licença-paternidade será concedida ao cônjuge que não utilizar a licença-maternidade, seguindo orientações do STF e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
4. Benefício adicional por deficiência:
- A licença será acrescida em um terço do tempo total caso a criança ou adolescente tenha alguma deficiência.
5. Estabilidade no emprego:
- O projeto prevê proteção contra demissão sem justa causa desde o início do gozo da licença até um mês após o retorno ao trabalho.
6. Acúmulo com o "empresa cidadã":
- Para as companhias já participantes do programa "Empresa Cidadã", os 20 dias da nova lei serão somados aos 15 dias adicionais já previstos, podendo totalizar 35 dias de afastamento remunerado.
A força das evidências: Por que ampliar é essencial
A decisão de estender a licença não é apenas política, mas está embasada em robustas evidências acadêmicas, como as compiladas pelo Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da USP (Made-USP), que demonstram ganhos significativos para toda a sociedade.
Desenvolvimento infantil e vínculo familiar
- Presença essencial: A participação paterna nos primeiros dias de vida é fundamental para o desenvolvimento saudável da criança.
- Melhores resultados: Estudos internacionais (Canadá, Suécia, Noruega) correlacionam licenças mais longas e, em especial, "intransferíveis" (que o pai deve usar ou perder), a um maior envolvimento paterno duradouro nas tarefas de cuidado.
- Ganhos cognitivos e emocionais: Esse maior envolvimento está ligado a melhores resultados cognitivos e emocionais para as crianças, além de um melhor desempenho escolar futuro.
Impacto positivo na carreira materna
- Redistribuição do cuidado: A licença-paternidade é uma ferramenta crucial para dividir o trabalho de cuidado dentro de casa.
- Alívio da "penalidade da maternidade": Ao compartilhar as responsabilidades desde o início, a mãe encontra melhores condições para se recolocar ou se manter no mercado de trabalho, resultando em impactos positivos de curto e médio prazo em sua remuneração, formalização e condição de ocupação.
Cenário laboral para os pais
- Sem prejuízo salarial: A maior parte da literatura acadêmica aponta que a licença estendida não acarreta discriminação ou perdas salariais para os pais, diferentemente do que ocorre frequentemente com as mães. Os empregadores não tendem a penalizar os homens pelo uso do benefício.
Vantagens para empresas e sociedade
- Retenção de talentos: Para as empresas, a política está associada a uma maior retenção de talentos e à redução de pedidos de demissão voluntária.
- Redução de desigualdades: Ao fomentar a divisão equitativa do cuidado, a medida contribui indiretamente para a redução da violência doméstica e para a construção de um ambiente social mais igualitário e saudável.
- Estímulo à natalidade: Em países com alta insegurança econômica, como o Brasil, políticas de apoio parental como esta podem ser um fator impulsionador das taxas de natalidade, ao reduzir inseguranças e sinalizar maior apoio social à criação dos filhos.
Um avanço inegável, mas em um caminho mais amplo
Embora a aprovação na Câmara seja um avanço histórico, especialistas alertam que a licença-paternidade não é a solução definitiva e isolada. Para que seus benefícios em termos de equidade de gênero sejam plenamente alcançados, é necessário integrá-la a um ecossistema robusto de políticas públicas de suporte, como a:
- Expansão de creches públicas.
- Criação de mais escolas em tempo integral.
- Reforço de outras redes de apoio familiar e estatal.
O retorno do projeto ao Senado será o passo final para consolidar este direito que promete modernizar as relações familiares e de trabalho no país.
