Por que o jovem mais pobre abandona a escola? Evasão, trabalho e a crise do Ensino Médio no Brasil
O Ensino Médio, etapa final da educação básica, é um divisor de águas para o futuro dos jovens, mas no Brasil, ele tem atuado como um espelho das profundas desigualdades socioeconômicas e raciais. Analisando dados recentes, é possível traçar um panorama que, apesar de avanços notáveis, revela desafios persistentes que afetam milhões de adolescentes.
Panorama geral: Progresso lento e desafios acumulados
O Brasil tem melhorado o acesso e a conclusão do Ensino Médio, mas o ritmo é insuficiente e o ponto de partida é baixo.
- Taxa de conclusão (até 19 Anos): O índice subiu de 54,5% em 2015 para 74,3% em 2025.
- Atraso na conclusão: Este patamar ainda está significativamente abaixo da conclusão do Ensino Fundamental (até 16 anos), que atingiu 88,6%.
- Razão do abandono: A pesquisadora Manoela Miranda (Todos Pela Educação) destaca que muitos alunos chegam ao Ensino Médio acumulando defasagens de aprendizagem e atrasos na trajetória, o que frequentemente culmina no abandono.
O abismo socioeconômico: Renda define destinos
A desigualdade mais gritante é a que separa os estudantes por faixa de renda, uma lacuna que reflete diretamente a necessidade de trabalhar e a percepção de valor da escola.
Taxa de conclusão - Ricos vs. Pobres (2025):
- 20% mais ricos: A taxa de conclusão é de 94,2%.
- 20% mais pobres: A taxa é de apenas 60,4%.
Diferença persistente:
O abismo entre os grupos mais ricos e mais pobres é de 33,8 pontos percentuais.
- Projeção de igualdade: Mantido o ritmo atual de redução, seriam necessários 23 anos para que ricos e pobres tivessem a mesma chance de concluir essa etapa.
- Motivos do abandono (mais pobres): Entre os 20% mais pobres, 8,3% citam a necessidade de trabalhar (contra 2,8% dos mais ricos) e 10,6% alegam falta de interesse (contra 1,5% dos mais ricos).
Desigualdades de raça e gênero: Múltiplas exclusões
As disparidades se manifestam também em função da raça e do gênero, apontando para desafios específicos enfrentados por cada grupo.
Disparidade racial em números:
Taxa de conclusão (2025):
- Brancos e amarelos: 81,7%.
- Pretos, pardos e indígenas (PPI): 69,5%.
A diferença:
A diferença entre os grupos era de 12,2 pontos percentuais em 2025.
- Projeção de eliminação: No ritmo atual, essa desigualdade racial só seria eliminada em 2041.
Diferença de gênero:
- Conclusão feminina vs. masculina: As mulheres superam os homens, com 78,5% de conclusão contra 70,2% para os homens.
- Fatores de exclusão: Para os homens, a necessidade de trabalhar e a falta de interesse são motivos preponderantes. Para as meninas, desafios como a gravidez precoce e a sobrecarga de afazeres domésticos são barreiras significativas.
Disparidades regionais: Um Brasil em múltiplas velocidades
O avanço na conclusão não é uniforme no país, mas as regiões que historicamente partiam de patamares mais baixos têm acelerado o progresso devido a políticas estaduais focadas.
Regiões com maior aceleração (2015 a 2025):
- Nordeste: Saltou de 63,6% para 84,8%.
- Norte: Subiu de 66,5% para 82,5%.
Regiões com maior conclusão (2025):
- Sudeste: 92,7%.
- Centro-Oeste: 91,9%.
- Sul: 88,4%.
Caminhos para a transformação: Estratégias consolidadas
Especialistas defendem a adoção de estratégias comprovadas para acelerar a universalização da conclusão do Ensino Médio, focando em qualidade, incentivo e permanência.
- Expansão do ensino integral: Mais horas na escola permitem recuperar defasagens e garantir uma aprendizagem mais sólida (defendida por Claudia Costin).
- Incentivo financeiro: Programas como o Pé de Meia, que oferece auxílio financeiro condicionado à permanência, são essenciais para reduzir a evasão causada pela necessidade de trabalhar.
- Valorização docente: Melhorar a formação e a atratividade da carreira dos professores é um ponto crucial para a qualidade do ensino.
- Reforma curricular e engajamento: A implementação do Novo Ensino Médio, com itinerários formativos que permitem ao aluno escolher disciplinas de interesse, pode aumentar o engajamento e a permanência.
A educação é a chave para a mobilidade social e para construir um país mais justo. As histórias de Henry e Agatha, que recorreram ao ENCCEJA para ter uma segunda chance, simbolizam a resiliência e a necessidade de garantir que todo jovem tenha a oportunidade real de concluir sua formação.
