Ikigai, rádio taiso e dieta: Os 3 pilares da longevidade japonesa e como eles aumentam a expectativa de vida

O Japão consolidou-se como um fenômeno global envelhecimento. Em 2025, o país anunciou um recorde histórico: quase 100 mil cidadãos com 100 anos ou mais, sendo que 88% desse grupo são mulheres. Esta é a 55ª vez consecutiva que o Japão bate esse recorde. Figuras inspiradoras como Tomoko Horino, uma consultora de beleza centenária que ainda trabalha, e Shigeko Kagawa, a pessoa mais velha do país com 114 anos, personificam essa realidade extraordinária. Mas o que explica essa excepcional longevidade, especialmente entre as japonesas? A resposta é um complexo e fascinante conjunto de fatores culturais, dietéticos e sociais.
1. A dieta japonesa: A base da saúde
A alimentação é frequentemente apontada como o pilar principal da longevidade japonesa.
- A dieta tradicional, rica em peixes, legumes, verduras, soja e algas, é pobre em gorduras saturadas e carne vermelha.
- Essa combinação está diretamente ligada a menores taxas de obesidade, doenças cardíacas, acidentes vasculares e certos tipos de câncer, como os de mama e próstata. Campanhas públicas bem-sucedidas também reduziram drasticamente o consumo de sal e açúcar ao longo das décadas, combatendo a hipertensão e o diabetes. É relevante notar que as mulheres japonesas têm um dos índices de obesidade mais baixos do mundo, o que ajuda a explicar sua vantagem na expectativa de vida sobre os homens.
2. Atividade física integrada à rotina
Os japoneses não encaram a atividade física apenas como uma ida à academia, mas como parte do cotidiano.
- Caminhar e utilizar o transporte público são hábitos comuns até idades avançadas, mantendo o corpo ativo.
- Um símbolo cultural é o "Rádio Taiso", um programa de exercícios de três minutos e meio transmitido diariamente pela televisão há quase um século. Praticado em grupos em parques, escolas e empresas, ele promove não apenas a saúde física, mas também o espírito comunitário, combatendo o isolamento social.
3. O caso exemplar de Okinawa: Uma "zona azul"
A ilha de Okinawa é um laboratório vivo para estudos sobre envelhecimento.
- É uma das cinco "Zonas Azuis" do mundo, regiões onde as pessoas vivem muito mais e com melhor saúde. O Estudo de Centenários de Okinawa, iniciado em 1975, acompanha milhares de indivíduos.
- Os resultados mostram que os idosos de Okinawa mantêm altos níveis de atividade física, uma dieta baseada em vegetais e um forte senso de propósito na vida (conhecido como "Ikigai"). Cerca de um terço dos centenários lá são independentes, um testemunho de um envelhecimento saudável e ativo.
Fatores sociais e de bem-estar
O ambiente social japonês oferece suportes cruciais para a terceira idade.
- O governo promove políticas de valorização do idoso, como o "Dia do Idoso" (15 de setembro), quando novos centenários recebem uma carta de congratulações e um presente simbólico do primeiro-ministro.
- Essa integração social e o reconhecimento pelo Estado contribuem para o bem-estar mental. Além disso, muitos idosos continuam trabalhando ou envolvidos em atividades comunitárias, o que lhes dá um sentido de utilidade e pertencimento.
Ressalvas e desafios: A outra face da moeda
Apesar dos números impressionantes, é crucial abordar o tema com precisão.
- Desafios na contagem: Em 2010, uma auditoria no Japão descobriu que mais de 230 mil pessoas registradas como centenárias estavam "desaparecidas". Casos extremos, como o de um homem cujos restos mortais foram encontrados 32 anos após sua morte, revelaram falhas nos registros civis. Suspeita-se que algumas famílias, para continuar recebendo pensões, não reportem óbitos.
- Contexto global: Projeções da ONU indicam que a China e os EUA ultrapassarão o Japão em número total de centenários nas próximas décadas, devido ao seu tamanho populacional. O próprio Japão enfrenta uma crise populacional, com baixíssima taxa de natalidade, o que torna a sociedade idosa um desafio econômico e social.
Um feixe de fatores, não uma fórmula mágica
A longevidade recorde das mulheres japonesas não é resultado de um único segredo, mas sim da convergência de múltiplos elementos. A combinação de uma dieta saudável, um estilo de vida ativo, um forte tecido social e políticas públicas que valorizam os idosos cria um ambiente ideal para uma vida longa. No entanto, esse sucesso convive com desafios, como a necessidade de sistemas de registro mais confiáveis e a pressão sobre uma sociedade que envelhece rapidamente. O exemplo do Japão serve, portanto, como uma fonte valiosa de inspiração e aprendizado para o mundo, mostrando que a chave para uma velhice saudável está na integração harmoniosa entre hábitos individuais e um ambiente comunitário de apoio.