AVPN: A guardiã da verdadeira pizza italiana - Além da Marguerita - A história da pizza napolitana e seu título da UNESCO

A Pizza é muito mais do que uma simples refeição; é um fenômeno global, um símbolo de cultura e uma paixão universal. No entanto, o que define uma "verdadeira" pizza italiana, especificamente a napolitana, é um conjunto de regras rigorosas, tradição e uma história profundamente enraizada na cidade de Nápoles. Este resumo detalha a essência dessa iguaria, a instituição que a protege e o delicado equilíbrio entre tradição e inovação.
Início: O epicentro da tradição da pizza
- A história nos leva a Nápoles, sul da Itália, para a sede da Associazione Verace Pizza Napoletana (AVPN). Fundada em 1984, esta organização nasceu com um propósito claro: "promover e proteger" o tesouro culinário mais famoso da cidade. O sucesso de sua missão foi tão significativo que, em 2017, a "Arte do Pizzaiolo Napolitano" foi reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade pela Unesco. A AVPN tornou-se a guardiã oficial desta arte, recebendo aspirantes a pizzaiolos de todo o mundo que desejam aprender os segredos da autenticidade.
As características e regras de uma "vera pizza napoletana"
A autenticidade da pizza napolitana é definida por um protocolo estrito, semelhante ao que protege o Champagne ou o Queijo Parmesão. As diretrizes da AVPN são extremamente detalhadas e abrangem todos os aspectos do processo:
- A massa: Deve ser um "disco arredondado" com uma borda alta e crosta fofa, conhecida como cornicione, com no máximo 1 a 2 cm de altura. A textura final deve ser "macia", "elástica" e, crucialmente, dobrável (a portafoglio). Pontos queimados ou bolhas grandes são considerados defeitos.
- Os ingredientes: São focados na simplicidade e qualidade. Os sabores tradicionais são a Marguerita (molho de tomate, queijo Mozzarella di Bufala Campana ou Fior di Latte, manjericão fresco e azeite) e a Marinara (molho de tomate, orégano, alho e azeite).
- A técnica: O pizzaiolo não pode usar rolo para abrir a massa; ela deve ser esticada apenas com as mãos. É expressamente proibido usar assadeira; a pizza deve ser assada diretamente no forno.
- O forno e o tempo: O forno tradicional é a lenha, mas, desde 2020, fornos elétricos também são permitidos pela AVPN (uma decisão polêmica). O tempo de asseio não pode exceder 60 a 90 segundos.
- O consumo: A pizza deve ser consumida imediatamente, idealmente dentro de 10 minutos após sair do forno, para apreciar sua textura única.
A jornada do pizzaiolo e a certificação
Tornar-se um pizzaiolo certificado pela AVPN é um processo exigente. Aspirantes participam de um curso intensivo de nove dias em Nápoles, onde estudam desde técnicas de fermentação e hidratação da massa até o movimento preciso de colocar e retirar a pizza do forno. No entanto, a conclusão do curso é apenas o primeiro passo. Para que uma pizzaria no exterior receba a cobiçada certificação, ela deve:
- Contratar um pizzaiolo formado pela AVPN.
- Enviar um dossiê completo com formulários, fotos da cozinha, equipamentos e vídeos do processo de preparo.
- Passar por uma rigorosa avaliação pela sede da associação em Nápoles.
A fiscalização contínua e a importância do selo
- A certificação não é vitalícia. A AVPN mantém um controle de qualidade através de "agentes secretos da pizza" que visitam as pizzarias credenciadas ao redor do mundo de forma discreta. Se um estabelecimento for flagrado descumprindo os padrões — por exemplo, servindo uma massa crocante ou usando técnicas não aprovadas —, corre o risco de ter seu credenciamento revogado imediatamente. Este sistema garante que o selo AVPN seja uma garantia global de autenticidade para os consumidores.
Contexto histórico e críticas: Preservação ou produção de um mito?
- A padronização da pizza napolitana é, ironicamente, uma invenção relativamente recente. No passado, cada família de pizzaiolos em Nápoles tinha sua própria técnica, transmitida oralmente. A AVPN foi fundada na década de 1980 por Antonio Pace e outras 16 famílias de mestres pizzaiolos (as "17 famílias") justamente para combater a proliferação global de imitações de baixa qualidade e criar um padrão universal. Alguns historiadores, como Karima Mover-Nocchi, argumentam que este processo vai além da simples preservação; ele "produz" uma tradição e cria uma mística de exclusividade que aumenta ainda mais o desejo pelas pizzas certificadas.
Além de Nápoles: A diversidade italiana da pizza
É crucial notar que a pizza napolitana, apesar de sua fama, não é a única pizza da Itália. O país possui uma vasta gama de estilos regionais:
- Pizza Romana: Massa fina e crocante, aberta com rolo.
- Pizza al Taglio: Assada em assadeiras retangulares e vendida por peso.
- Pizza Frita: Uma especialidade napolitana onde a massa é frita.
- Pizzonta: Uma variação frita da região de Abruzzo.
- Inúmeras Focaccias e Pães: Que se assemelham e se confundem com o conceito de pizza.
A AVPN protege especificamente o estilo napolitano, que se tornou a "representação oficial" mais reconhecida internacionalmente.
Um equilíbrio entre tradição e evolução
A missão da AVPN é, acima de tudo, a preservação de uma identidade cultural. Como afirmou Massimo Di Porzio, vice-presidente da associação, "a pizza napolitana não é necessariamente a melhor, mas é a pizza que tem suas raízes mais fortes na cultura. Então, é uma habilidade que nós precisamos ensinar e preservar." No entanto, mesmo os guardiões da tradição reconhecem que a evolução é inevitável. A aceitação de fornos elétricos e a experimentação com novos sabores por mestres respeitados como Gino Sorbillo mostram que a pizza é uma arte viva. O verdadeiro legado da AVPN é, portanto, garantir que, independentemente das inovações, os métodos tradicionais e a alma da pizza napolitana autêntica continuem sendo ensinados, respeitados e apreciados pelas gerações futuras, em Nápoles e em todo o mundo.