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quinta-feira, 25 de setembro de 2025 às 11:54 GMT+0

Da favela à fábrica: Como o crime organizado alcançou a autossuficiência em armas de guerra

A recente descoberta de fábricas clandestinas de fuzis em São Paulo marcou um ponto de virada na segurança pública brasileira. Esse evento, mais do que uma grande apreensão, é o ápice de uma jornada de quatro décadas do crime organizado rumo à autossuficiência bélica. Este texto explora as etapas dessa escalada e os desafios que o Brasil enfrenta agora.

A gênese: A corrida armamentista e as favelas do Rio de Janeiro

Tudo começou nas décadas de 1980 e 1990. A ascensão de grandes facções como o Comando Vermelho (CV) e o Terceiro Comando (TC) e a expansão do tráfico de cocaína para as favelas do Rio de Janeiro desencadearam uma intensa disputa por territórios. Para garantir a supremacia, essas facções deram início a uma verdadeira corrida armamentista, onde o fuzil se tornou o principal instrumento de poder. A resposta do Estado, adotando a "paridade de fogo" e equipando a polícia com fuzis, consolidou um ciclo de militarização da segurança pública.

O que isso significa? A demanda por armas pesadas nasceu da disputa entre as próprias facções, não apenas como uma reação à repressão policial. Esse estágio inicial estabeleceu a lógica da escalada bélica que se mantém até hoje.

As rotas de abastecimento: Do arsenal do estado ao contrabando internacional

Com a crescente demanda, o crime organizado diversificou suas fontes de armamento. Inicialmente, o próprio Estado se tornou uma fonte crucial, com desvios de arsenais militares e policiais facilitados pela corrupção. Paralelamente, consolidou-se uma rota de tráfico internacional, principalmente com armas dos Estados Unidos, que entravam no país pelo Paraguai. Para reduzir riscos e aumentar os lucros, os criminosos adotaram um "modelo IKEA": contrabandeavam as peças separadamente para serem montadas no Brasil por armeiros especializados.

O que isso significa? A capacidade de adaptação do crime ficou evidente. A diversificação das rotas de abastecimento e a profissionalização do contrabando transformaram armas pesadas em uma commodity global, gerando fluxos financeiros bilionários.

A exploração das brechas legais: O fenômeno CAC

Entre 2019 e 2022, uma nova e preocupante porta de entrada se abriu: A flexibilização da legislação de armas. O aumento no número de registros para Colecionadores, Atiradores Desportivos e Caçadores (CACs) foi rapidamente explorado. Facções e milícias passaram a usar laranjas para adquirir armamentos legalmente e, em seguida, desviá-los para o mercado ilegal. Investigações revelaram que quase 6.000 armas de CACs foram desviadas, um aumento de 68% em um curto período.

O que isso significa? Essa brecha legal funcionou como um "subsídio" involuntário do Estado, permitindo que o crime organizado modernizasse seu arsenal com armas novas e de alto poder, adquiridas com baixo risco.

O salto quântico: A autossuficiência com as "ghost guns"

A descoberta das fábricas clandestinas é o ponto culminante dessa evolução. Ao dominar a produção doméstica com máquinas de alta precisão, o crime organizado começou a fabricar "ghost guns" (armas-fantasmas) armas sem número de série, que são praticamente impossíveis de rastrear. Isso quebra a cadeia de investigação criminal e torna o suprimento de armas independente de fronteiras e de grandes apreensões.

O que isso significa? A produção nacional de fuzis é um divisor de águas. O desafio para o Estado deixa de ser apenas apreender armas que entram no país e passa a ser desmantelar uma indústria paralela e sofisticada. Isso confere ao crime uma resiliência sem precedentes, podendo intensificar a violência urbana.

Um novo paradigma para a segurança pública

  • A trajetória do poder de fogo do crime no Brasil, das disputas entre facções à industrialização da violência, é um alerta. O aumento das apreensões de fuzis, como os 732 no Rio de Janeiro em 2024, esconde um paradoxo: cada arma apreendida indica que um volume muito maior está em circulação.

Para enfrentar essa nova fase, a estratégia do Estado deve evoluir. Não basta apenas o confronto tático com mais armamento. É essencial superar o adversário em inteligência, cooperação entre forças e foco na descapitalização do crime, desarticulando redes de corrupção e lavagem de dinheiro. A lição central é clara: a guerra contra o poder de fogo do crime não será vencida apenas com mais fuzis, mas com uma estratégia tão inovadora e implacável quanto a do inimigo.

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