Por que a Geração Z e Millennials dificilmente terão a vida financeira dos Baby Boomers?

A jornalista Katty Kay, da BBC Worklife, inicia uma reflexão poderosa ao comparar sua trajetória de vida com a dos jovens adultos de hoje. A sua experiência, comum à sua geração de emprego garantido após a formatura, aquisição de uma casa própria antes dos 30 anos e formação de uma família com relativa segurança financeira soa como um conto de fadas para os millennials e a Geração Z. Esta análise, conduzida em conversa com a especialista em economia Kyla Scanlon, investiga as raízes desse abismo geracional, suas consequências e possíveis caminhos para um futuro mais equilibrado.
O abismo geracional e a "anomalia" boomer
A geração conhecida como Baby Boomers (nascidos entre 1946 e 1964) viveu o que pode ser considerada uma anomalia histórica perfeita. Este foi um período único de prosperidade alimentado pela expansão econômica do pós-Segunda Guerra Mundial. As condições eram excepcionais: Mobilidade social ascendente era uma realidade tangível, o custo da habitação era drasticamente mais baixo em relação aos salários, e a educação superior oferecia um retorno financeiro previsível e garantido. Kyla Scanlon, de 27 anos, enfatiza que não se trata de culpar os boomers individualmente, mas de reconhecer que eles se beneficiaram de um contexto histórico excepcional que dificilmente se repetirá. A relevância deste ponto está em contextualizar que a frustração atual não é uma falha individual dos jovens, mas o resultado do contraste com uma época economicamente única.
Os pilares do desequilíbrio econômico atual
Vários factores estruturais convergiram para criar um ambiente económico radicalmente diferente para as gerações mais jovens. Entre os mais críticos, encontram-se:
- Crise habitacional: O preço das moradias disparou, aumentando quatro a cinco vezes nas últimas décadas. Um dado revelador ilustra o problema: Há mais baby boomers donos de casas com três quartos do que millennials, justamente a geração que precisa desse espaço para formar família.
- Carga financeira extrema: Os custos com educação superior (que gera dívidas estudantis imensas), creches e assistência aos idosos atingiram valores proibitivos. Cuidar de um idoso pode custar uma média de
US$ 10 mil
por mês nos Estados Unidos. - Estagnação salarial e inflação: Os salários não acompanharam o ritmo de inflação e do custo de vida, corroendo o poder de compra dos jovens.
- Representação política desequilibrada: A classe política, com idade média significativamente superior à da população (como o Senado dos EUA, com idade média de 65 anos), é acusada de criar políticas que perpetuam seus próprios interesses, como a resistência a mudanças nas leis de zoneamento que poderiam baratear a construção de novas moradias.
As consequências psicológicas: Do niilismo financeiro à perda de esperança
Talvez o aspecto mais alarmante desta crise seja o seu impacto na saúde mental e nas aspirações de uma geração inteira. Kyla Scanlon alerta para o surgimento do "niilismo financeiro". Este é um estado de desespero em que os jovens simplesmente desistem de economizar para a aposentadoria, de avançar na carreira ou de planear um futuro a longo prazo, por não acreditarem que ele exista. David Brooks, do The New York Times, chama isto de "economia da rejeição", onde a experiência constante de ser rejeitado em aplicativos de namoro, processos seletivos de emprego e candidaturas universitárias esgota a resiliência e elimina qualquer senso de esperança. A relevância disto é profunda: Uma população jovem desesperançada representa uma ameaça à inovação, ao crescimento económico futuro e à coesão social.
Possíveis caminhos e soluções propostas
Scanlon defende que é necessário um reshuffle das expectativas. O "sonho" tal como foi definido na era boomer pode estar ultrapassado. Contudo, ela também aponta soluções políticas concretas que poderiam reconstruir uma base de oportunidades. Inspirar-se em modelos de outros países desenvolvidos é crucial. As sugestões centram-se em três pilares:
1.
Habitação: Priorizar a construção massiva de moradias, revisando leis de zoneamento e investindo em programas de habitação social, seguindo exemplos como o da Áustria.
2.
Família: Criar subsídios ou programas públicos para reduzir drasticamente os custos exorbitantes com creches, permitindo que as pessoas possam ter filhos sem cair em dificuldades financeiras.
3.
Rede de segurança: Reforçar a rede de segurança social, especialmente no que diz respeito aos cuidados para idosos, para aliviar a carga financeira que recai sobre as gerações mais jovens.
Um chamado para a reavaliação coletiva
A conclusão é clara e contundente. A geração mais jovem não está a enfrentar apenas uma fase difícil, mas uma reestruturação fundamental do contrato social e económico. A era de ouro do pós-guerra foi um ponto fora da curva histórica, e seus benefícios não foram repassados adiante de forma equitativa. O artigo serve como um alerta urgente: A perpetuação deste abismo geracional, alimentado por políticas de curto prazo e uma desconexão da liderança, está a fomentar uma crise de esperança com consequências imprevisíveis. A solução exigirá uma mudança dupla: Uma adaptação realista das expectativas pelos jovens e, mais criticalmente, uma vontade política corajosa de redesenhar as estruturas económicas para que ofereçam oportunidades tangíveis, estáveis e justas para todos, independentemente da geração. O futuro económico de uma nação depende da sua capacidade de cuidar dos seus jovens tanto quanto dos seus idosos.