"Escracho" digital: Como Trump e Bolsonaro redefiniram a guerra política com o uso das redes sociais como tática central de polarização afetiva
A política moderna, cada vez mais centrada no espetáculo digital, transformou o ato de desmoralizar publicamente o adversário "o escracho" em uma tática poderosa de comunicação populista. Este resumo explora como a personalização da política, da era Trump ao bolsonarismo, instrumentaliza o escracho para moldar a percepção pública e gerar polarização.
O contexto: Política como performance e a quarta onda populista
Vivemos uma quarta onda populista global, cuja principal característica é a polarização afetiva, onde o foco é no "gostar ou não gostar" do que na disputa ideológica.
- Palco principal: As Redes Sociais. O ambiente digital é o cenário onde a política se torna um confronto constante, amplificando o alcance de discursos radicais.
- Radicalização do debate. O uso intensivo das redes sociais leva à formação de "bolhas" homogêneas, fechadas ao diálogo e que enfraquecem o pluralismo.
- O escracho como estratégia de poder. A desmoralização e a ridicularização do adversário deixam de ser atos isolados e se consolidam como um método deliberado para conquistar e manter o poder.
O impacto nas novas gerações: Exaustão e descrença
Os jovens, que vivenciam a política majoritariamente pelas plataformas digitais, demonstram um profundo cansaço e desencanto com as formas tradicionais de representação.
1. Baixa confiança institucional. Pesquisas como a Juventudes do Brasil (2021) mostram que a grande maioria dos jovens possui baixa confiança em partidos políticos e no Congresso Nacional.
2. Deslocamento de confiança. A descrença nas instituições tradicionais leva os jovens a transferir sua confiança para estruturas como igrejas e Forças Armadas, o que pode explicar a afinidade com discursos de cunho autoritário.
3.Política como conflito. A política nas redes é frequentemente associada a sentimentos de ansiedade, medo e ódio, tornando-se um sinônimo de conflito e ruptura, o que desestimula a participação e a expressão de opiniões próprias.
As redes e a consolidação do método do escracho
Desde 2016, a lógica do engajamento algorítmico transformou a comunicação populista.
- Algoritmos como mediadores: As plataformas digitais atuam microssegmentando os usuários, premiando conteúdos escandalosos e de alto engajamento que polarizam, em detrimento do debate aprofundado.
- A relação de poder na comunicação: A dinâmica das redes amplifica a teoria de Pierre Bourdieu:
toda comunicação é uma relação de poder, e no digital, o escracho se torna o catalisador desse poder.
Líderes populistas e a política personalizada
O escracho é a ferramenta central da personalização da política, onde os líderes se comunicam como indivíduos (personalidades) e não como representantes de um projeto coletivo.
Donald Trump: A ruptura e o trolling político
- Twitter como palco. Trump rompeu as barreiras diplomáticas e partidárias, utilizando as redes para insultar adversários e ridicularizar instituições, transformando o escracho em seu principal método.
- Normalização do intolerável. Sua tática era o trolling político, a provocação deliberada para deslocar os limites do aceitável e baixar o nível do debate público. O conteúdo programático tornou-se secundário à performance do ataque.
Jair Bolsonaro: Performance e ilusão de intimidade
- Reprodução da fórmula. No Brasil, Bolsonaro explorou a crise partidária com um discurso agressivo, pautado em ataques pessoais e notícias falsas, fazendo do escracho um modo de governar.
- Líder como personalidade. Seu estilo misturava ironia, religião e provocação para criar um vínculo emocional direto com os seguidores.
- Nós contra Eles. A retórica do confronto substituiu o debate por uma disputa afetiva, sustentando a mobilização na ilusão de intimidade entre o líder e o cidadão.
O futuro da política em um cenário polarizado
O cenário eleitoral permanece desafiador, com a crise partidária e a polarização em alta.
- O escracho como método consolidado: É crucial reconhecer que o escracho deixou de ser um comentário impulsivo e se tornou uma tática central de comunicação populista no ambiente digital.
- Interesse jovem fragmentado: O interesse político dos jovens é real, mas se manifesta de forma informal e mediada por algoritmos, onde a política é parte do consumo digital e está sujeita à lógica de "curtir" ou "cancelar".
- Adaptação ao novo jogo: Para todos os atores democráticos, entender e se adaptar a estas novas regras do jogo que valorizam a quebra deliberada de normas tradicionais é um imperativo.
O imperativo da consciência digital
A ascensão do escracho de Trump a Bolsonaro revela que a política digital não é apenas sobre informação, mas sim sobre performance afetiva e personalização extrema. Diante da exaustão e descrença juvenil, e do poder dos algoritmos que premiam o conflito, o escracho consolida-se como um método eficaz para mobilização e governo, substituindo o debate programático pela lógica do "nós contra eles". O futuro da democracia exige, portanto, a urgência de uma consciência digital que vá além do engajamento, permitindo a todos os cidadãos e instituições decodificar essa tática para proteger o pluralismo e reverter a erosão da confiança pública.
